ATA DA PRIMEIRA SESSÃO ESPECIAL DA PRIMEIRA SESSÃO LEGISLATI­VA ORDINÁRIA DA DÉCIMA PRIMEIRA LEGISLATURA, EM 13.04.1993.

 


Aos treze dias do mês de abril do ano de mil novecentos e no­venta e três reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, em sua Primeira Sessão Especial da Primeira Sessão Le­gislativa Ordinária da Décima Primeira Legislatura. Às quinze horas e vinte minutos, constatada a existência de “quorum”, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos da presente Ses­são Especial destinada a debater o tema da campanha da Frater­nidade de mil novecentos e noventa e três lançada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB, conforme Requerimento nº 67/93 (Processo nº 710/93) de autoria do Vereador Gerson Almeida. Compuseram a Mesa: Vereador Clóvis Ilgenfritz, 2º Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Doutor Newton Burmeister, Secretário Municipal do Planejamento, representan­do o Senhor Prefeito Municipal; Doutor Elton Bozetto, Secretá­rio de Comunicação da Região Sul III CNBB; Doutor Leonildo Mi­gon, Secretário Executivo do Fundo de Desenvolvimento Social, representando a Secretaria do Planejamento Territorial e Obras do Estado do Rio Grande do Sul; Doutor Saulo Sirena, represen­tante da CARITAS; Doutor Richart Gomes, representante da Coor­denação Estadual do Movimento de Luta pela Moradia; Irmão Ave­lino Madalozzo, representando a Pontifícia Universidade Católica do Estado; e a Vereadora Clênia Maranhão, 2ª Secretária. A seguir o Senhor Presidente manifestou-se acerca da solenidade e concedeu a palavra aos Senhores Vereadores que falariam em nome da Casa. O Vereador Gerson Almeida, proponente e em nome da Bancada do PT, reportou-se sobre o motivo da realização desta Sessão, ressaltando que foi em função do tema escolhido pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB para a campanha da Fraternidade. Propugnou por melhores condições de vida, ha­bitação, saúde, transporte, lazer, segurança e emprego para a população brasileira. Falou sobre projeto de lei de iniciativa popular para a criação do Fundo Nacional de Habitação juntamente com a iniciativa de captação e gestão de recursos para a habitação, reforçando o movimento do povo pela reforma urbana. A Vereadora Clênia Maranhão, pela Bancada do PMDB, saudou a ini­ciativa do Vereador Gerson Almeida pela proposição desta Sessão para resgatar a importância da campanha da CNBB. Discorreu sobre a necessidade de discussão do direito de cidadania, ressaltando a luta contra a desordem financeira e os excessos de bu­rocracia no sentido que se reavalie as planilhas de custo dos programas habitacionais. Parabenizou a Casa e a CNBB pela designação dessa campanha para com aqueles que não tem teto. A Verea­dora Maria do Rosário disse que o tema oferecido pela CNBB traz à reflexão de uma das mais profundas contradições que o povo brasileiro está submetido, através da Campanha da Fraternidade. Ressaltou que é preciso construir um programa alternativo de moradia popular com investimento de recursos para novas construções na perspectiva de regularização fundiária e reforma urbana com melhorias das condições necessárias para uma vida digna. O Ve­reador Lauro Hagemann, pela Bancada do PPS, falou sobre traba­lho desenvolvido por seu Partido em prol da reforma urbana. Discorreu sobre o êxodo rural e suas conseqüências nos grandes centros, falando sobre o compromisso assumido com a cidade de Porto Alegre em transformá-la em local adequado para a vida das  populações. Deu conta da importância do assunto referente ao proposto nesta Sessão. Na ocasião, o Senhor Presidente registrou as presenças do Jornalista Firmino Cardoso, representando a Associação Riograndense de Imprensa; Arquitetos Vanderlei Abílio, Valmor Fortes e Alice Beatriz, representando o Sindicato dos Arquitetos, o Conselho Regional de Engenheiros, Arquitetos e Agrônomos do Rio Grande do Sul e o Instituto dos Arquitetos do Brasil, respectivamente; Senhor Gustavo de Mello, representando o DEMHAB; Doutor Paulo Bortoluzzi, representando o Jornal do Comércio; Senhor João Couto, da Executiva Estadual do PT; Doutor Carlos Salzano Vieira da Cunha, Presidente Estadual do Movimento de Assistência Cristã; Senhor Alberto Torres e o Presidente da FRACAB; e, ainda, comunicou que o Suplente Reginaldo Pujol havia sido empossado nesta data, no Gabinete do Senhor Presidente, em substituição ao Vereador Jair Soares, nos dias treze e quatorze do corrente, informando que Sua Excelência integra­rá a Comissão de Constituição e Justiça. O Vereador Reginaldo Pujol, discorreu sobre o pronunciamento do representante do Governo do Estado quando falou sobre os critérios a serem desen­volvidos com relação à aplicação dos recursos oriundos dessa nova legislação. Falou sobre os programas habitacionais que deram certo no País, afirmando que sempre houve a presença do Município. Durante a Sessão, o Senhor Presidente comunicou que o Ve­reador Reginaldo Pujol apresentou diploma legal, bem como declaração de bens, constando: um imóvel, um automóvel, um terreno e aplicações financeiras. A seguir, o Senhor Presidente concedeu a palavra aos Senhores Leonildo Migon, Newton Burmeister, Saulo Sirena, Richart Gomes e Elton Bozetto que discorreram acerca do tema da presente Sessão realizada para debater a Cam­panha da Fraternidade proposta pela CNBB “Onde Moras?”, afir­mando ser o direito à moradia condição básica para o desenvol­vimento de vida plena e do exercício da cidadania. Às dezessete horas o Senhor Presidente declarou encerrados os trabalhos da presente Sessão, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador Clóvis Ilgenfritz e secretariados pelos Vereadores Clênia Maranhão e Milton Zuanazzi. Do que eu, Clênia Maranhão, 2ª Secretária, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada pelo Senhor Presidente e por mim.

 

 


O SR. PRESIDENTE: Temos a honra de presidir esta Sessão destinada a debater o tema da Campanha da Fraternidade, de 1993, lançada pela CNBB, por solicitação, Requerimento aprovado por unanimidade nesta Casa, do Ver. Gerson Almeida.

Abrindo os nossos trabalhos, queremos designar as pessoas presentes, que nos honram já com a sua presença na Mesa, além da Verª Clênia Maranhão, que é Secretária da Casa, Secretária da Mesa Diretora; temos o Secretário Municipal do Planejamento, Dr. Newton Burmeister, representando o Sr. Prefeito Municipal; Ilmo. Sr. Representante da Secretaria do Planejamento Territorial e Obras do Estado do Rio Grande do Sul, Dr. Leonildo Migon, Secretário Executivo do Fundo de Desenvolvimento Social; Ilmo. Sr. Secretário de Comunicação da Região Sul III CNBB, Dr. Elton Bozetto; o Dr. Saulo Sirena, Representante da CARITAS; o Sr. Richart Gomes, Representante da Coordenação Estadual do Movimento de Luta pela Moradia. Depois denominaremos outras pessoas representantes de Entidades, que honram a Câmara de Vereadores de Porto Alegre, presentes nesta Sessão.

Queria, inicialmente, convidar as pessoas que estão na platéia, para que venham fazer parte do Plenário, e, em nome da Presidência da Casa, na qualidade de Vice-Presidente em exercício, dizer que este horário de reunião foge à regra normal, pois nossas reuniões se realizam normalmente em outro horário - muitas pessoas, Vereadores, e outros telefonaram para cá se desculpando em função de não ter sido possível adaptarem suas agendas com o horário desta Sessão.

Passo a palavra ao nosso orador que vai falar em nome dos Vereadores da Casa, o Ver. Gerson Almeida, que é o proponente dessa Sessão, pela Bancada do PT.

 

O SR. GERSON ALMEIDA: Sr. Presidente, companheiro Clóvis Ilgenfritz; Vereadora Clênia Maranhão; companheiro Newton Burmeister, representando o Prefeito da Cidade; Dr. Elton Bozetto; Ilmo. Sr. Secretário de Comunicação da Região Sul III da CNBB, Sr. Leonildo Migon, Secretário Executivo do Fundo de Desenvolvimento Social e nesta ocasião representa a Secretaria do Planejamento Territorial e Obras do Estado do Rio Grande do Sul; Ilmo. Sr. Representante do Jornal do Comércio, Dr. Paulo Bortoluzzi; Ilmo. Saulo Sirena, representante da CARITAS; Sr. Richart Gomes, representante da Coordenação Estadual do Movimento de Luta pela Moradia; companheiro João Couto, representando o Movimento dos Trabalhadores sem-teto e todos os demais presentes, autoridades, companheiros e companheiras.

A motivação que nos fez propor a realização desta Sessão Especial é a extrema relevância do tema escolhido pela CNBB para a Campanha da Fraternidade e o reconhecimento da necessidade de um engajamento de toda a sociedade visando buscar soluções para a questão da moradia. Ao escolher a pergunta “Onde moras?”, como lema, a CNBB reconhece o direito à terra e à moradia como condição básica de exercício da cidadania, incorporando a dimensão ética de um cristianismo que se revigora no cotidiano das lutas sociais, e que busca se tornar contemporâneo à luta dos trabalhadores por uma sociedade justa, fraterna, democrática e aberta à diversidade.

Na apresentação do texto-base da campanha, o Secretário Geral da CNBB, D. Antônio Celso Queiroz, lembra que “a situação dos que não têm chão e teto clama por justiça e solidariedade. A Campanha da Fraternidade quer assumir esse grito. Quer somar-se ao gemido dos milhões sem moradia digna. Quer oferecer a voz de todos os cristãos como amplificador desse gemido, até torná-lo clamor ensurdecedor e insuportável para a sociedade.”

O nosso Partido, e muitos outros partidos populares, democráticos, assim como várias entidades de luta social, popular e comunitária, já nasceram profundamente vinculados à luta dos movimentos sociais por melhores condições de vida, procurando expressar no espaço público a angústia e a esperança que cercam o cotidiano de milhões de pessoas, excluídos de qualquer modalidade verdadeiramente humana de habitação em um país onde o déficit habitacional já ultrapassa, folgadamente, 10 milhões de unidades residenciais. Temos clareza de que é fundamental propor e exigir do Estado políticas públicas que viabilizem a moradia. Essas políticas devem incluir não apenas a moradia propriamente dita, mas também condições de saúde, transporte, lazer, segurança e emprego, consubstanciadas por um projeto nacional que garanta a retomada do crescimento econômico com distribuição de renda. A envergadura dessas políticas deixa claro que somente com planejamento e pesados investimentos por parte do Estado será possível obter resultados efetivos a curto e médio prazo.

É fundamental, em primeiro lugar, a contraposição radical aos padrões impostos pelo BNH, e, posteriormente, pela Caixa Econômica Federal, que consolidaram em sua aplicação uma visão anti-social do problema da moradia. Essa política, sem levar em conta as condições regionais, acumulou uma série de erros e equívocos, entre os quais destacamos uma gestão centralizadora e autoritária, a partir de gabinetes em Brasília; a distribuição regional dos recursos orientada por critérios político-eleitorais e clientelistas; a ausência de canais de participação popular na formulação e gestão da política de recursos. Enfim, ainda vigora o mais absoluto distanciamento entre a produção habitacional pública, bastante limitada e as práticas espontâneas, que garantem a produção das cidades reais, onde vive a maioria da população.

Mesmo reconhecendo que cabe ao Governo Federal responder à demanda de habitação, nossa experiência no governo de alguns dos principais centros urbanos do país foi marcada por iniciativas importantes nessa área.

Procuramos atuar articulados com iniciativas autônomas do movimento de moradia, através de mobilizações como a campanha de coleta de assinaturas para o Projeto de Lei de Iniciativa Popular para criação do Fundo Nacional de Habitação. Juntamente com estas iniciativas no campo da captação e gestão de recursos para a habitação, procuramos reforçar a luta do movimento popular pela reforma urbana, com o estabelecimento de uma lei de desenvolvimento urbano que, elaborada em conjunto com a população, inclua os diversos agentes produtores, consumidores e apropriadores da cidade, garantindo o espaço para os segmentos historicamente excluídos do processo de decisão e evitando que se reproduza o planejamento autoritário, necessariamente homogeneizador, que desconhece identidades, lugares, espaços e territórios.

Procuramos, também, potencializar a capacidade de autogestão dos projetos habitacionais dos movimentos populares, incentivando a criação de cooperativas e a realização de mutirão com o apoio do poder público. Infelizmente, em várias cidades, onde questões como essa avançaram, está se vivendo um retrocesso, como por exemplo a suspensão, pelo Governo de São Paulo, dos mutirões de moradias populares. Em Porto Alegre, ocupamos uma boa parte da primeira gestão da Administração Popular num trabalho de recuperação do DEMHAB como órgão apto a estabelecer, coordenar e implementar políticas urbanas, devido ao grande sucateamento e desgaste em que se encontrava o Departamento.

Hoje, a partir principalmente, da experiência do Orçamento Participativo, a população tem condições de incidir diretamente na alocação de recursos para a regularização de vilas. A Zero Hora de hoje traz uma reportagem sobre a mudança nas condições de vida dos moradores da Vila Planetário, um modelo de intervenção do poder público municipal na gestão Olívio Dutra. Naquele local, a concessão do direito real de uso e a urbanização da vila permitiram a elevação à condição de cidadãos plenos às noventa famílias que ali moravam há três décadas. Nas palavras do Presidente da Associação dos Moradores do Jardim Planetário “hoje os moradores têm um forte motivo para lutar por uma vida melhor”. Essa demonstração é clara em relação ao quanto é possível ser feito no resgate da cidadania de pessoas que, até então, não tiveram motivos para lutar por uma vida melhor, o quanto a melhoria das condições de vida é um elemento propulsor da sua própria luta pela sua construção como um cidadão pleno, completo, íntegro, capaz e disposto a desafiar as dificuldades do mundo.

Existem ainda em Porto Alegre 240 ocupações irregulares do solo urbano, num total de 500 mil pessoas vivendo em condições subumanas. No entanto, podemos hoje afirmar que, combatendo a má utilização do dinheiro público, respeitando as especificidades e demandas da população organizada e democratizando a gestão da política urbana e habitacional, é possível responder em grande parte ao quadro estarrecedor a que chegou a questão da habitação em nosso País.

Ao defender que o Estado tem um papel importante na execução de políticas públicas, nós somos, portanto, contrários à premissa básica da ofensiva ideológica neoliberal que acompanha as políticas econômicas conservadores, que afirmam querer reduzir drasticamente a intervenção e os gastos do Estado. Na verdade, o que ocorreu na última década e no início desta é que diminuíram os gastos sociais e com infra-estrutura, para aumentar os gastos militares e os subsídios pagos à indústria, acelerando o processo de apropriação privada do patrimônio público. No Brasil assistimos a concretização dessa política através da entrega do nosso parque siderúrgico, essencial para alavancar qualquer projeto de desenvolvimento, para a iniciativa privada, em condições de explícito favorecimento. Isto não significa qualquer idéia de estatização da sociedade, mas, sim, assegurar ações capazes de impedir o trágico processo de concentração de riquezas que faz com que os 10% mais ricos detenham metade da renda nacional. O Estado será mais capaz de alavancar políticas populares na medida em que for “invadido” por um múltiplo e poderoso controle social, que só é possível com a organização de fortes e plurais movimentos da sociedade.

Por fim, cabe-nos destacar que um mandato de parlamentar, um mandato de uma Câmara de Vereadores, de uma Assembléia Legislativa, em qualquer executivo, ele deve necessariamente estar articulado orgânicamente com as demandas populares e com os anseios da população.

Por isso quero, em nome meu, e da Bancada do Partido dos Trabalhadores e, por que não, de vários outros Vereadores, que não podem estar aqui presentes, de outras Bancadas, saudar a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil que, mais uma vez, dá mostras de sua preocupação em engajar-se na luta por uma sociedade sem excluídos. No que depender de nossa Bancada, e deste Vereador, certamente, esta Casa deverá constituir-se, também, em alavanca de superação da situação dramática que vive nossa Cidade, os setores populares, os setores dos deserdados e os setores dos excluídos.

Muito obrigado a todos os representantes e que esta Sessão possa ajudar, de alguma forma, esta luta. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra a Verª Clênia Maranhão, pela Bancada do PMDB.

 

A SRA. CLÊNIA MARANHÃO: Sr. Presidente, Ver. Clóvis Ilgenfritz; Sr. Ver. Gerson Almeida, proponente desta Sessão; Sr. Representante do Prefeito Municipal, do Fundo de Desenvolvimento Social e da Secretaria de Planejamento do Estado; Srs. Representantes da CNBB; Representantes das entidades que lutam pela habitação, companheiros que estão aqui presentes.

Inicio saudando a iniciativa de meu colega, Ver. Gerson Almeida, por ter proposto esta Sessão para resgatar a importância da campanha da CNBB. Hoje, no Brasil, essa questão da habitação começa a ocupar as preocupações daqueles que não tenham conquistado o direito básico da moradia. É uma brutalidade e uma crueldade não ter onde morar. A maioria da população do nosso Estado e do nosso País tem feito com que amplos setores da nossa sociedade comecem a somar-se na luta pela conquista desse direito básico de cidadania, que é o direito à moradia.

Sabemos que as iniciativas políticas do Governo Federal, na área da habitação, nos últimos anos, têm levado apenas à construção de mansões e à retirada de dinheiro do Fundo de Garantia, que deveria ser aplicado na habitação popular, para a construção de outras obras faraônicas ou elitistas. A campanha da CNBB vem recolocar no centro da discussão da moradia, a questão do direito da cidadania, a questão do direito básico de todo o cidadão. É preciso que se discuta hoje, cada vez mais, para se ampliarem as parcerias dos poderes Federais, Estaduais e Municipais e da Sociedade Civil comprometida com a nação e com a população deste País, porque nós acreditamos que a gravidade da situação da falta de moradia no Brasil só vai ser possível ser solucionada com a parceria mais ampla possível, construída pelo sentimento de compromisso e de tentativa de resgate da condição humana de todas as cidadãs e cidadãos deste País.

É preciso que se lute contra a desordem financeira, contra os excessos da burocracia; que se reavaliem as planilhas de custo dos programas habitacionais; e que, principalmente, se coloque no centro das nossas preocupações os seres humanos, os homens e as mulheres deste País. Não só como Vereadora, tenho acompanhado esta luta trazida pelo Ver. Gerson Almeida, mas também como cidadã e como Vice-Presidente da Federação das Mulheres do Brasil, tenho lutado na pressão política para garantir habitação para as mulheres chefes de família, e posso dizer para as senhoras e senhores aqui presentes que, talvez, o drama mais brutal de uma mulher que é mãe é não ter onde acolher os filhos que saíram do seu útero, na mesma casa onde deveria coabitar toda a sua família.

Parabenizo a Casa por esta iniciativa; a CNBB, pela designação deste ângulo; e a todas as entidades que hoje demonstram a sensibilidade e o compromisso de se preocupar com aqueles que não têm teto. Muito obrigada.

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Convido o irmão Avelino Madalozzo para fazer parte da Mesa como Vice-Reitor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; cito a presença que muito nos honra do Jornalista Firmino Sá Brito Cardoso, representando a Associação Riograndense de Imprensa; do Arquiteto Vanderlei Abílio, representando o Sindicato dos Arquitetos do Rio Grande do Sul; do Sr. Gustavo de Mello, representando o Departamento Municipal de Habitação; do Dr. Paulo Bortoluzzi, representando o Jornal do Comércio; e do Sr. João Couto, da Executiva Estadual do Partido dos Trabalhadores.

Com a palavra a Verª Maria do Rosário.

 

A SRA. MARIA DO ROSÁRIO: Sr. Presidente, Ver. Clóvis Ilgenfritz; Sr. Representante do Governo Municipal, Sr. Newton Burmeister; Ver. Gerson Almeida, proponente dessa Sessão Solene; Representante da CNBB; Irmão Avelino, Vice-Reitor da PUC; Dr. Leonildo Migon, Secretário Executivo do Fundo de Desenvolvimento Social; Senhores e Senhoras presentes.

O Brasil é um país realmente cheio de contradições e, nos tempos últimos, temos podido observar o acirramento dessas contradições a um nível impressionante. Um Brasil de contradições muito profundas, onde pessoas não têm onde morar. Com esse tema a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil nos traz à reflexão de uma das mais profundas contradições, de uma das mais graves a que o povo brasileiro está submetido nesta Campanha da Fraternidade de 1993. Nós somos, hoje, cerca de sessenta milhões de pessoas que estão sem teto ou em condições de sub-moradia. Somos nós mesmos, os brasileiros - quando nos referimos a isso não podemos tratar somente das pessoas - mas nós mesmos os sessenta milhões de pessoas sem teto ou em condições de sub-habitação. Um déficit de cerca de doze milhões de moradias. A cada ano faltam mais de quinhentas mil.

Passado por diferentes campanhas, diferentes momentos, por diferentes soluções colocadas para o povo brasileiro, ele se desespera porque não vê essa solução, porque a cada dia mais gente está na rua, principalmente num quadro onde cento e vinte milhões de pessoas vivem nas cidades. O que determina que milhares de pessoas não encontrem um lugar para viver? O que determina o empobrecimento tal de uma população que eleva o crescimento da nossa região metropolitana de cento e cinqüenta e cinco por cento de favelas, nos últimos dez anos, quando a população cresceu sessenta e quatro por cento? O que determina esse empobrecimento? Senhores e Senhoras, esse empobrecimento não é senão manifestação da mais vil crise social. A negação do direito de morar, de não ter para onde ir é, objetivamente, o agravamento do modelo de concentração de riquezas na mão de poucos.

O verdadeiro espólio de uma Nação inteira que não tem para onde ir, que não tem mais de onde tirar riquezas; de uma nação que está sendo ultrajada, porque seus filhos são ultrajados; prostituída a Nação, porque seus filhos são prostituídos; abandonada completamente e, lamentavelmente, essa solução não passa somente pelas campanhas publicitárias, pela identificação dos problemas, mas por se encontrar um novo projeto para o Brasil. É disso que a Nação Brasileira reclama e é disso que ela fala quando se organiza nos seus movimentos, quando vai para a rua, quando questiona o direito de propriedade e o direito de vida digna e toma os lugares, dizendo: eu não tenho para onde ir e é aqui que eu preciso ficar. Em muitos momentos, essa questão está colocada para nós que ocupamos um Parlamento Municipal, para nós que somos representantes da sociedade civil, das nossas diversas organizações. Muitas vezes, o direito de propriedade se contradiz com o direito da vida digna, com direito de ter um chão, um teto, onde deixar seus filhos. A opção, para nós, neste momento, está colocada.

É preciso construir um programa alternativo de moradia popular, um programa que enfrente a ganância daqueles que fazem dos vazios urbanos um meio de construir e avolumar riquezas. É preciso enfrentar o problema dos vazios urbanos, são necessárias soluções. Somente se alcançará isso com investimento de recursos para novas construções, trabalhando na perspectiva da regularização fundiária e uma profunda reforma urbana com melhorias das condições necessárias para uma vida digna. Trata-se de unir esforços. Nossa ação junto ao movimento popular e comunitário na luta pela moradia vem sendo esta: unir as iniciativas não governamentais com as iniciativas dos governos municipal, estadual e federal, no sentido de se enfrentar, mesmo que parcialmente, a questão da moradia no nosso País.

Nosso Partido, o PC do B, pensa que precisamos enfrentar mais profundamente este problema que faz parte da estrutura desigual sobre a qual a Nação brasileira se erigiu. Reconhecemos que, para modificar um problema desse tipo, é preciso se tocar e modificar profundamente a estrutura econômica e social deste País. Queremos construir uma nova perspectiva social, uma perspectiva de igualdade, de fraternidade que, pensamos, seja a perspectiva socialista. Não há outro caminho, senão aquele que aprendemos com os próprios moradores em suas lutas, que é o caminho da luta e da denúncia que a CNBB tão bem faz e que todos nós temos interpretado nos diferentes momentos da luta social, na tomada de terras, na defesa de um pedaço de chão para viver dignamente uma família, um povo, o povo brasileiro. Muito obrigada. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Convidamos o Ver. Fernando Zachia para tomar lugar à Mesa em substituição à Verª Clênia Maranhão. Agradecemos a presença do Presidente da FRACAB e da Diretora do Departamento de Habitação da
FRACAB, e do colega Arquiteto Valmor Fortes, representando o Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia. Também esteve há pouco o Ver. José Gomes e representantes da Cootravipa.

Passamos a palavra ao Dr. Leonildo Migon, Secretário Executivo do Fundo de Desenvolvimento Social da Secretaria do Planejamento Territorial e Obras do Estado do Rio Grande do Sul.

 

O SR. LEONILDO MIGON: Vereador Clóvis Ilgenfritz, Presidente desta Sessão, demais Vereadores, senhores presentes.

Em nome do Governo do Estado, através da Secretaria de Obras, representando aqui o Secretário Jorge Debiagi, eu apenas quero fazer algumas colocações sobre as providências que o Governo do Estado está tomando no sentido de amenizar este cruciante problema que aflige a nossa população mais carente, na área habitacional. Já foi dito aqui que o déficit habitacional brasileiro gira em torno de 10 a 12 milhões de habitações, envolvendo cerca de 60 milhões de pessoas. É um volume gigantesco de recursos necessários para resolver este cruciante problema. Nós sabemos que, infelizmente, o País não dispõe de recursos suficientes para tanto.

Entretanto, entendemos que alguma providência deve e pode ser tomada pelo Governo Federal, pelo Governo do Estado, e pelos governos municipais, juntando esforços, visando a, senão resolver estes problemas, pelo menos amenizá-lo, atendendo naquilo que é mais carente nesta área.

Neste sentido, o Governo do Estado tomou uma iniciativa inédita, já no ano de 1991, buscando fontes de recursos que serão canalizados para o atendimento da área habitacional. Tomou iniciativa de propor à Assembléia Legislativa um projeto de lei visando a aumentar a alíquota de alguns produtos, que, naquela oportunidade, em 1991, não foi entendido por parte dos nossos legisladores estaduais, uma vez que não logrou êxito este projeto de lei.

Insistiu o Governador do Estado em 1992, com uma nova tentativa de buscar recursos gerados aqui no Estado, uma vez que os recursos da área federal tornaram-se escassos ou completamente ausentes para a área habitacional do Estado. Nos últimos dois anos, praticamente, não ocorreram aportes de recursos da área Federal para o atendimento das necessidades habitacionais do Estado do Rio Grande do Sul. A nossa COHAB, praticamente, ficou inativa nestes dois anos.

Sensibilizados por esta nova iniciativa do Governo do Estado, os nossos legisladores estaduais aprovaram a lei de nº 9828, já na sessão extraordinária do dia 05.02.93. Esta lei, que tem como fundamento a aprovação da elevação da alíquota de 17% para 18% dos produtos que pagam ICMS, destina recursos para a área habitacional. Destes recursos provenientes desse acréscimo do ICMS, 70% serão destinados ao atendimento das necessidades da área habitacional.

Logicamente, a elevação de 17 para 18% implica um retorno maior de ICMS para os Municípios, indistintamente.

Desta forma, o Governo do Estado, neste programa voltado para a habitação, está induzindo os Municípios a que se engajem neste programa. Entendemos que somente com o engajamento da municipalidade é que conseguiremos o êxito necessário para o atendimento das necessidades mais prementes do setor habitacional. Por várias razões, não só pelo fato de os Municípios estarem recebendo um retorno maior de ICMS, mas também porque entendemos que os municípios conhecem mais do que ninguém as necessidades da sua comunidade. E entendemos também que o município também pode contribuir, além dos recursos que está recebendo a mais de retorno de ICMS, com a sua estrutura para, em conjunto com o Estado, resolver, ou pelo menos amenizar o problema habitacional no Estado.

Os recursos que o Estado receberá, provenientes desse programa que será gerido pelo Fundo de Desenvolvimento Social, serão da ordem de 41 milhões de dólares em 1993. E vale ressaltar que essa Lei 9828 tem um prazo de validade até o dia 31 de dezembro de 1993. Pretende o Governo do Estado revalidá-la no final deste ano, para que em 1994 também tenhamos esses recursos. Destes 41 milhões de dólares destinados pelo Governo do Estado ao Fundo de Desenvolvimento Social, 70%, portanto, algo em torno de 28,29 milhões de dólares, deverão ser destinados à área habitacional que, juntamente com os recursos que os municípios vão receber, com o acréscimo dessa alíquota do ICMS na ordem de 13 a 14 milhões de dólares, teremos então um valor substancial como ponto de partida, como iniciativa do Governo do Estado, no sentido de atender as nossas populações mais carentes na área habitacional.

As providências que o Governo do Estado está tomando são no sentido de buscar, junto aos municípios, as necessidades que cada município tem de habitações para as populações de até 5 salários mínimos de renda familiar. O objetivo principal é de atendimento às populações cuja renda do casal se situe em até 3 salários mínimos, visando com isso a atender realmente os mais necessitados. O programa prevê habitações de tamanho máximo de 45m2 e evidentemente que na Grande Porto Alegre é intenção do Governo do Estado não criar novas habitações para que isso não sirva de atrativo de migração de novas populações em busca de habitação na Grande Porto Alegre. Nesse sentido, o que se fará na Grande Porto Alegre será a erradicação de sub-habitações. Logicamente que nesse trabalho de erradicação de sub-habitações, nós precisamos construir novas habitações que, lógico, a regularização dessas vilas, dessas sub-habitações implicará a necessidade de construção de novas habitações, mas estas novas habitações não serão colocadas à disposição dos interessados e sim dos que já moram, daqueles que já residem nessas vilas irregulares.

Esse é o programa para a Grande Porto Alegre e para o interior do Estado, aí nós pretendemos construir novas habitações naquilo que for necessário.

É evidente que com esse volume de recursos nós não vamos conseguir atender às necessidades do Estado, calculadas hoje em 400 mil habitações. O que se pretende é construir cerca de 20 a 30 mil habitações/ano, com recursos desse programa. Isto dá uma idéia da participação na solução do total de carência de habitações no Estado. Entretanto, acho que é uma iniciativa extremamente importante e inédita no Estado, uma vez que a partir desse momento o Governo do Estado tomou ciência e tomou providências visando à solução desse gravíssimo problema. Mas o que importa e interessa é que, através desse movimento, nós pretendemos engajar a força dos municípios e com isto logicamente vamos conseguir aumentar o próprio volume de recursos destinados ao programa. Muitos municípios já manifestaram a sua intenção de participar, não só com a infra-estrutura e o terreno, que é o que nós estamos solicitando com participação mínima dos municípios, mas também pretendem eles participar com o material e pretendem também participar com mão-de-obra.

Tanto quanto possível, nós vamos conveniar com os municípios a construção de habitações. Os critérios que nós vamos utilizar para o atendimento das necessidades de cada município têm como ponto fundamental a necessidade estimada para cada município. Em relação a essa necessidade é que nós iremos fazer então o atendimento, observada aquela proporção, porque nós temos um déficit de cerca de 400 mil habitações e nós vamos produzir cerca de 20 a 30 mil habitações/ano.

Já temos o Conselho de Administração formalizado, nomeado, formado por três Secretários de Estado, sob a Presidência do Secretário de Obras Jorge Debiage, integrado também por três representantes da FRACAB, três representantes da FAMURGS, um representante do Conselho Estadual de Saúde, um representante da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, um representante do Instituto dos Arquitetos do Brasil, formando um corpo de 13 representantes do Conselho de Administração, que é o órgão que vai traçar as diretrizes de funcionamento do Fundo de Desenvolvimento Social, através do qual se desenvolve o Programa Habitacional. Este Fundo, ali no Programa Habitacional, vai atender necessidades também na área de segurança: Brigada Militar, Corpo de Bombeiros e Polícia Civil, e também vai destinar recursos, 10% do volume, para a área de saúde, na compra de medicamentos e matéria-prima para medicamentos, visando a atender as populações mais carentes.

Nós devemos, nos próximos dias, anunciar o deslanche do Programa com o envolvimento já de cerca de 40 Municípios que já tem projetos que avolumam cerca de 3500 habitações. Este será o deslanche efetivo do Programa Habitacional, através de recursos do Fundo de Desenvolvimento Social. Eram estas as comunicações que eu tinha a fazer neste evento, que é de extrema valia, na medida em que estamos motivando não só, como sempre foi, o Governo Federal a alocar recursos na área habitacional, mas também, principalmente, a área estadual e, especificamente, a área municipal, as prefeituras municipais, de quem esperamos, realmente, uma contribuição importante neste nosso Programa. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Temos a satisfação de registrar a presença do Ver. Reginaldo Pujol entre nós, que estará aqui a partir de hoje. Temos muito prazer de contar com a sua presença, Vereador.

Quero dizer, também, que a Verª Maria do Rosário deixou conosco aqui na Mesa o material da UAMPA, União das Associações de Moradores de Porto Alegre, com uma minuta das conclusões do Seminário em Defesa da Moradia. Está aqui à disposição daqueles que desejarem cópias.

Com a palavra o Sr. Newton Burmeister.

 

O SR. NEWTON BURMEISTER: Prezado Ver. Clóvis Ilgenfritz, que preside os trabalhos, Srs. Vereadores, Senhoras e Senhores.

As estatísticas, por si só, reveladoras de todo o tamanho do problema que foi referenciado aqui, por aqueles que nos antecederam. Seria repassar isso, seria reiterar o óbvio, que nós temos tido pelas nossas vivências todas, nas suas diversas lutas, identificando este problema crucial no País. A habitação não pode e nem deve ser tratada exclusivamente como um problema técnico ou exclusivamente como um problema social. Ela tem que ser contextualizada como um problema político fortemente referencial em termos dos destinos da cidadania e da nação.

A extrema velocidade da urbanização do País nos últimos 30 anos, revelou-se como um dos fatores indicativos da grande deficiência da organização do País nas suas políticas. Não que não houvesse recursos. Nos anos 70 quando o Banco Nacional da Habitação de cada cem, não vou referir à moeda, mas de cada cem que se destinava a este, nesta situação, nos tombos do caminho, quarenta chegavam efetivamente ao final dessa situação. Isso configurava uma política com relação aos recursos que eram destinados a essa finalidade, marcadamente eivada pela relação que se estabelecia naquela época dos interesses que ali se envolviam. Isso são situações que nós não podemos deixar de recordar, porque são raízes desta história. Se hoje nós temos contextualizado o nível de problemas não foi porque antes alguma coisa tenha sido feita ou deixado de ser feita. Elas são exatamente o resultado daquilo que foi proposto como política.

O isolamento da sociedade, da participação e da gestão desses recursos foi, sem dúvida nenhuma, uma das situações que fizeram com que as situações se definissem da forma como se definiram. Foram feitas, à época, quatro milhões de unidades financiadas pelo dito SFH. Não restou daquilo um projeto sequer de tecnologia que tivesse avançado, uma situação das relações que se insinuaram das cooperativas. Não restou disto a não ser os benefícios daqueles que se privilegiaram daquela circunstância. Sem dúvida nenhuma se privilegiaram. Envolver a comunidade é fundamental. A gestão dos recursos é um processo que deve estar engajado na raiz destas políticas. Nós temos hoje, precariamente ainda estabelecido, o gestor do Fundo de Garantia. Mas foi alguma coisa que foi capaz de dar algum tipo de orientação para estas relações. Mas ainda não é aquilo que se tem expectativa e nem aquilo que deve ser construído. Ter a expectativa de que o Município, por si só, seja aquele capaz de resolver estas situações é criarmos uma falsa ilusão. Não será o Município exclusivamente aquele capaz de resolver estas situações mas ele é capaz de tencionar estas relações e, trazer estas situações da questão da terra que é uma estrutura fundamental a ser resolvida na sociedade, não só da terra urbana mas a questão fundiária como um todo no País. Porque uma coisa não acontece sem a outra. A questão da cidade ela não é da cidade só porque as cidades cresceram. Por que cresceram as cidades? É porque existe uma outra situação, pré-requisito que também não foi resolvido. Então estas situações todas elas estão imbricadas num processo extremamente complexo de não soluções anteriores ou de pulos sobre problemas desviados e não atendidos em oportunidades que se contextualizaram politicamente. O poder público municipal, como nós dissemos, ele tem a capacidade e a possibilidade de tencionar estas relações. De tomar iniciativas para estes tencionamentos.

Eu quero, neste momento, referenciar uma iniciativa do governo, hoje, naquilo que diz respeito à Cidade Constituinte, que é uma iniciativa em direção à sociedade, de todos os atores da sociedade que circulam nesse tabuleiro de contradições que é o urbano. Que cidade queremos: que cidade deve ser construída? Que expectativa nós temos? E a Cidade Constituinte aborda quatro temas fundamentais: a reforma urbana, a questão do financiamento da cidade, a questão da vocação da cidade e a questão da circulação do transporte. Desses quatro grupos haverá subprodutos e discussões que irão enriquecer os níveis de debates que ocorrerão, mas é uma oportunidade extremamente forte para que todos os agentes políticos, atores sociais, que desenvolvem as suas atividades dentro do contexto urbano, possam expressar-se. Sabemos que no meio desses atores e desses agentes existem aqueles que têm a sua perspectiva da sociedade já delineada; sabemos, também, que no meio desses há aqueles que ainda não conseguiram delinear a sua diretriz, mas a oportunidade de um debate fará com que essas relações se estabeleçam e que as contradições também se explicitem, porque um dos pré-requisitos para que se formule política é que sejam explicitadas as contradições.

Temos, em andamento, várias iniciativas que estão passando por crivos e por avaliações, que são aquelas da possibilidade do poder público municipal e uma das questões é a do parcelamento do solo. Outra situação que se desenvolve, sem dúvida nenhuma, será aquela, quando da Cidade Constituinte, a questão do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano, que será uma das situações a serem discutidas e com vários interesses aí envolvidos.

Quero dizer, também, que a cidade é a radiografia mais explícita da organização econômica social de uma sociedade. Ela demonstra e apresenta todos os seus ajustes ou iniqüidades. Se nós pudéssemos hoje repassar, como se fosse possível fazer um hemograma de uma cidade, fazer a contagem dos indicativos, nós perceberíamos que as cidades brasileiras estão seriamente comprometidas, estão doentes. E o remédio é um remédio extremamente forte e duro e tem que ser tomado.

Quero, por fim, reiterar aquela nossa manifestação relativamente à questão da Cidade Constituinte, fazendo um convite a todos, Vereadores, cidadãos e cidadãs da nossa Cidade, no sentido de que dela participem e que possam ter a oportunidade de ser agentes importantes na construção da Cidade e não mais pacientes daquilo que outrora achavam que devia ser uma cidade. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Queremos registrar a presença do Presidente Estadual do Movimento de Assistência Cristão, Dr. Carlos Salzano Vieira da Cunha.

Passamos a palavra ao Sr. Representante da Cáritas, Sr. Saulo Sirena.

 

O SR. SAULO SIRENA: Exmo. Sr. Presidente do Legislativo Municipal, Exmo. Sr. Gerson Almeida, proponente desta Sessão Especial, Exmos. Srs. Vereadores, demais autoridades presentes.

O lançamento da 30ª Campanha da Fraternidade, cujo tema para 1993 é a moradia, vem trazer a possibilidade de que a elaboração da política habitacional obtenha visibilidade pública, aumentando, dessa forma, os espaços de intervenção das organizações da sociedade civil neste processo.

A conjugação de uma boa intervenção no espaço institucional, com a pressão da opinião pública sobre as instituições, provou sua eficácia com a recente aprovação da nova Lei de Reforma Agrária, embora apresente algumas fragilidades. Este é um exemplo de luta que deve iluminar a ação dos agentes coletivos e políticos comprometidos com a Reforma Urbana. As boas causas, para surtirem efeito, devem merecer o apoio de toda a sociedade. Quem luta sozinho, lutará em vão.

A Campanha da Fraternidade, instituída no Brasil em 1962, sob tutela da Cáritas, aponta sua temática à reflexão de todos, enquanto momento forte da Igreja e da sociedade, cumprindo sua missão profética: denuncia as injustiças a que está sujeito o Povo de Deus e anuncia as possibilidades do reino que se faz aqui e agora. É um chamado à conversão pessoal e comunitária, tempo próprio para rever valores, conhecer a realidade, considerar o contexto social, na busca de respostas concretas e viáveis. A luta permanente dos movimentos sociais urbanos permite-nos afirmar a necessidade de se propor ao Estado e exigir dele, políticas públicas que viabilizam condições dignas de moradia popular.

Essas políticas reivindicatórias incluem não apenas a moradia propriamente dita, mas seu complexo universo de fatores, da produção ao consumo, como a saúde, transporte, lazer, segurança e, sobretudo, emprego. Essa é a luta das Entidades não Governamentais pela Reforma Urbana, enquanto espaço de discussão e veículo que unifica todas as suas iniciativas. Acreditamos ser os Conselhos Populares o veio de reação do povo organizado que busca solução para alguns de seus (...)

A Cáritas Brasileira-Regional no Rio Grande do Sul é um organismo da Pastoral Social da CNBB e atua há 32 anos neste Estado. A luta por melhores condições de vida é uma das prioridades permanentes de sua ação.

A Emergência Social da falta de condições dignas de moradia mobiliza os agentes de Cáritas e anima as experiências comunitárias como alternativas à situação apresentada.

Agradecemos o espaço concedido nessa Sessão Especial por iniciativa do Sr. Vereador Gerson Almeida, representante eleito pelo povo de Porto Alegre.

Reafirmamos nosso compromisso em defesa dos direitos humanos e nos solidarizamos com aqueles que buscam, notadamente, democratizar as discussões desses temas. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Nós queríamos registrar a presença da Arquiteta Alice Beatriz, representando o Instituto dos Arquitetos do Brasil, Departamento Rio Grande do Sul e do Sr. Alberto Torres, representando o Gabinete do Deputado Estadual Casagrande.

Também está presente o Ver. Lauro Hagemann, e se o Vereador quiser fazer o uso da palavra, nós chamamos os Vereadores representantes das Bancadas, ainda há tempo de o Vereador fazer o seu pronunciamento.

Com a palavra o Ver. Lauro Hagemann, pelo PPS.

 

O SR. LAURO HAGEMANN: Sr. Presidente e Srs. Vereadores, Srs. visitantes, eu me desculpo por ter chegado atrasado, mas estava atendendo a outro compromisso de ordem social - uma entidade de Cegos -, e soube, hoje, à última hora, que haveria esta solenidade e não poderia deixar de dizer duas palavras, neste ato, em nome do meu Partido - Partido Popular Socialista - que tem se dedicado, nesta Casa, a um trabalho intenso em prol do estabelecimento de balizas que propõe um início de reforma urbana. Hoje, na problemática brasileira, a reforma urbana assume contornos até mais imediatos do que a reforma agrária, porque ela é uma conseqüência da falta de reforma agrária, e se produziu a partir do desequilíbrio gerado pelo êxodo rural. Hoje, as cidades brasileiras estão com cerca de setenta por cento da população, e o campo está com trinta por cento da população. Há uns trinta, quarenta anos atrás, era o inverso. Então, em função disto a reforma urbana se apresenta como prioridade, talvez, maior do que a própria reforma agrária, em função desse desequilíbrio que se estabeleceu na sociedade brasileira.

E estamos preocupados com o crescimento indiscriminado da cidade, porque irá proporcionar, no futuro, um nível de vida deteriorado para as populações que irão nos suceder.

O nosso compromisso com Porto Alegre é conhecido, é sabido, temos estado presentes na vida desta Cidade, há muitos anos, e nos preocupa a situação urbana, ou a urbanização da cidade, a transformação da cidade num local adequado para a vida das populações, ou da população.

E, hoje, a CNBB, em boa hora, erigiu este ano como o “Ano da Moradia”, para a sua Campanha da Fraternidade. A moradia é um objetivo que o homem procura desde a caverna, e continua insolucionável até hoje. E, não é só aqui, é no mundo todo, mas nós que vivemos aqui temos a obrigação de trabalharmos para conseguirmos melhores condições para isso.

Hoje, felizmente, casualmente, saiu na Zero Hora uma página muito interessante que reflete bem o caráter da necessidade de uma reforma urbana, de uma melhoria da moradia e de proporcionar moradia para o cidadão dessa Cidade. Os moradores da Planetário mudam de vida e aí se diz que com uma moradia decente, adequada, até a vida do cidadão se transforma; ele passa a pensar de maneira diferente e é o que motivou essa reportagem. Até deixar de beber o cidadão se condiciona dentro de uma moradia decente e adequada. Por aí se pode ver o grau de importância que tem esse assunto e nós estamos muito satisfeitos com isso, porque a Vila Planetário é o começo de um instrumento que nós introduzimos aqui, nesta legislação municipal, na Lei Orgânica: a concessão real de uso. Estabelecemos e estamos com tramitação de mais três projetos da função social da terra; o solo criado, o banco de dados que está quase pronto. São mecanismos que se introduziram na legislação da Cidade e que visam a esse objetivo final. Nós temos um longo caminho a percorrer.

Convocamos toda a coletividade para que nos ajude neste propósito. Nós não seremos os arquitetos disso isoladamente. É todo um trabalho de Câmara, de sociedade. Estamos tendo a compreensão de entidades muito atuantes nesse campo; as entidades comunitárias são muito responsáveis por isso também e, naturalmente, o poder público com a sua decisão política de promover essas reformas. Por isso eu saúdo os participantes e peço desculpas, mais uma vez, pelo meu atraso e almejo que todos nós encontremos um caminho decente, construtivo, para chegarmos a este objetivo. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Nós estamos fazendo questão de presidir esta reunião com informalidade, mesmo porque o tema requer esses depoimentos, que são muito importantes, e não estavam previstos uma série deles, mas fazemos questão disso e, agora, eu recebo sinal de mais um Vereador, que deseja falar rapidamente, o nosso Vereador Reginaldo Pujol, representando o Partido da Frente Liberal. Depois, teremos a palavra do Sr. Richart Gomes. Representante da Coordenação Estadual do Movimento de Luta pela Moradia, e do Dr. Elton Bozetto, representante da CNBB nesta reunião.

 

O SR. REGINALDO PUJOL: Vereador Presidente, Ver. Clóvis Ilgenfritz; Srs. componentes da Mesa; Sr. Representante do Governo do Estado; Sr. Secretário do Município; Sr. Representante da CNBB, das diversas entidades da sociedade civil hoje aqui presentes, ocupadas, mais do que ocupadas, preocupadas em fazer frente a essa angustiante situação de carência de moradia, que não só em Porto Alegre, como no Estado e, infelizmente, em todo o País, se agudiza de forma impressionante nos últimos tempos. Bem falou o Ver. Clóvis Ilgenfritz que esta reunião tem se caracterizado pela informalidade. Somente por esta razão tenho a ousadia de - quebrando de certa forma o ritmo, e me valendo da porta aberta que o prezado amigo Ver. Lauro Hagemann me propiciou - ocupar a tribuna nesta hora, numa situação de privilégio pessoal, de grande satisfação, de vez que não faz cinco horas que me encontro instalado na condição de Vereador, ainda que transitória. Não podia deixar de trazer a minha palavra de confiança, de que nesta Casa, nesta hora, neste dia, nesta reunião, haveria de se trabalhar forte e fundamente em cima deste tão angustiante problema.

Sabem todos que, por circunstâncias da vida, na minha ação política anterior, por duas vezes estive frente a frente com esse problema aqui na Cidade de Porto Alegre. Aliás, quando ouvia o representante do Governo do Estado informar dos critérios que haveriam de ser desenvolvidos com relação à aplicação dos recursos oriundos dessa nova legislação, desse acréscimo do Imposto de Circulação de Mercadoria obtido por decisão da Egrégia Assembléia Legislativa do Estado, eu fiquei feliz, rejubilado, quando o mesmo informava que o Governo do Estado, na execução desse programa, pretendia engajar as administrações municipais da forma mais intensa possível. O tempo já nos ensinou: todos os programas habitacionais que deram certo neste País têm a presença do Município. Os exemplos são os mais eloqüentes nesse sentido. Parece-nos que aqueles programas que mais certo deram, relativamente à atuação dos Municípios, foram aqueles que, além do Município presente, contaram com a cobertura da sociedade organizada, da sociedade civil, dos mais diferentes segmentos da sociedade. Vejo, aqui, pessoas com as quais convivi nas vilas populares e que certamente teriam mais condições de dizer dessa situação.

Não quero me alongar, apenas solicito ao representante do Governo do Estado e executor desse programa que pretende, num curto espaço, desenvolver recursos na ordem de vinte e oito milhões de dólares na área da habitação popular do Rio Grande do Sul. Ouvi atentamente a sua exposição e um trecho não deixou de me chamar a sensibilidade, quando, sabiamente, o Governo do Estado estabelece que, para evitar novas migrações, não seriam contemplados, neste programa, habitações que não representassem a consagração de situações que de fato já existissem em Porto Alegre. Apelo ao Governo do Estado para que essas posições não sejam tão inflexíveis, porque certamente teremos, aqui, em Porto Alegre e na região Metropolitana, cruéis situações irregularizáveis, áreas habitadas nas mais sub-humanas condições, que justificaria a intervenção de uma política pública no sentido de debelá-lo. Não é possível regularizá-la devido à topografia, ou por várias outras circunstâncias. Não sejam rígidos é o meu apelo. Olhem as circunstâncias. E como disse o Secretário do Município, não deixem que a solução técnica seja tão forte que inviabilize a social, para que o social não seja tão expressivo que despreze toda a possibilidade técnica.

Nessa conjunção, que me parece corretamente proposta, peço ao ilustre representante do Governo do Estado que leve-a ao Dr. Debiagi, que preside esse grupo de trabalho, essa ponderação modesta, de quem não quis se furtar a esse debate. Não há dúvida nenhuma de que os debates, os seminários, enfim, todo esse aprofundamento da questão tem uma importância fundamental no equacionamento do problema, porque nós precisamos ter um fundamento, mas eu confio que nesta Casa, como de resto enquanto outros tiverem debatendo este problema, o debate seja enveredado para a objetividade de se fazer, agora e já, com a maior rapidez, para, se não debelar o problema, ao menos amenizá-lo nas suas mais cruéis manifestações que vemos a toda hora e a todo momento nas ruas da Cidade. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o Sr. Richart Gomes, Representante da Coordenação Estadual do Movimento de Luta pela Moradia.

 

O SR. RICHART GOMES: Eu quero saudar ao Sr. Ver. Clóvis Ilgenfritz, que preside a Mesa, ao Sr. Proponente, o Ver. Gerson Almeida, aos demais Vereadores, aos que estão a prestigiar a homenagem que faço também à CNBB por ter tido a sensibilidade de propor à Campanha da Fraternidade o tema moradia, e colocar que a expressão “habitar”, como se coloca hoje em pauta, não significa somente ter um espaço para morar, um teto sobre a cabeça, do contrário, estaríamos, todas as entidades que lutam por moradia, dentro delas, nós do Movimento, lutando por mais viadutos, nos quais muitos estão vivendo sob eles.

Hoje, nós queremos deixar bem claro que quando nos referimos à questão da moradia nos referimos também à questão da reforma urbana. Quando perguntamos “Aonde Moras?”, nós queremos saber que direito temos à cidade? Qual o espaço que temos nela? Essa é a questão profunda da reforma urbana, é um dos pontos que hoje nós não temos discutido, que é a democratização da cidade. Direito que tem o trabalhador, que hoje mora na periferia, mas constrói a riqueza aqui no centro, na estrutura toda da cidade.

Com uma experiência acumulada há mais de duas décadas, com a política habitacional do regime militar ficou demonstrado com clareza que não é unicamente através das linhas de crédito, por mais expressivas que sejam, que se resolve a questão do déficit habitacional neste País, neste Estado, ou nos Municípios. Nem tampouco a solução está exclusivamente no âmbito de instrumentos ou de programas específicos, como, por exemplo, lotes urbanizados, fundos - como os que levaram o BNH à falência - que não viabilizam uma política clara e concreta do sistema de habitação e financiamento. O próprio desvio do Fundo de Garantia para atender interesses que não são aqueles que a Constituição define; criar cestas básicas de materiais de construção ou formas alternativas daquele cooperativismo tradicional, proposto pelo Governo, para construção habitacional. Essas não são as formas que nos colocam como gestores da propriedade. A questão central está no fato de que há uma política habitacional que se resume simplesmente em financiar o mercado imobiliário com qualquer programa que privilegie os agentes privados do setor, ou seja, tem financiado aos proprietários de lotes urbanos, incorporados, empresários de materiais de construção; são estes que estão sendo privilegiados. No atual sistema de governo, esses agentes privados têm sido colocados como gestores das políticas habitacionais implantadas. Daí a pergunta: “Aonde Moras?” Tendo à sua disposição todos esses recursos, obviamente, esses gestores - agentes privados - que controlam a terra urbana e a política habitacional subjugam o atendimento das necessidades da população, em prol de seus interesses comerciais especificamente.

Contrapondo-se frontalmente à esta política, o Movimento de Luta pela Moradia exige - a palavra pode ser forte a quem ouve, mas também é forte a desagregação da população brasileira que vive na periferia, marginalizada, como também é forte a miserabilidade na qual vivem essas pessoas lá na marginalidade e, por isso nós exigimos a regulamentação da Lei de Desenvolvimento Urbano com as emendas populares, que está no Congresso engavetada há muito tempo, a aprovação do Fundo Nacional para moradia popular, encaminhado ao Congresso; nós exigimos que o estado de necessidade esteja acima do estado de propriedade; exigimos a desapropriação por necessidade pública; que as administrações municipais possam desapropriar aquilo que não é usado e distribuir para aqueles que querem usar. Eles não querem de graça, só querem ter condições de poder construir seu lote, sua casa. Queremos o direito de construir desvinculado do direito de propriedade. Queremos uma reforma urbana e uma reforma agrária sobre o controle dos trabalhadores; o estímulo ao tratamento cooperativo da terra, criando nos Municípios um banco de terra e que a propriedade fique sob o controle do órgão público, mas que a quem deva ser distribuída fique sob o controle popular. Queremos e exigimos a gestão dos recursos financeiros de habitação pelo movimento popular. Exigimos o não pagamento da dívida externa - nos últimos 10 anos deste País saiu para fora, para pagamento da dívida externa, cerca de onze bilhões de dólares, isto dava para construir doze bilhões de casas populares com infra-estrutura, urbanização, suavizando o problema habitacional deste País. Esse levantamento foi feito por Paulo Maluf, em cima dos valores mais caros de São Paulo, e o País não encontra como resolver o problema habitacional desse povo que está jogado à miserabilidade.

Chegamos à conclusão de que só o homem, o ser humano, sob o jogo do sistema, não tem o direito de morar como têm os demais animais irracionais, no entanto eles não interferem no direito de habitar. Nós, humanos, é que interferimos, mas até quando? Aí volta aquele questionamento que a Campanha da Fraternidade muito vem debatendo. Nós perguntamos: onde moras? A resposta vem logo, um tanto gritante , um tanto chocante, alguns dizem que é um tanto profissional, de um arcabouço de ocupações. Milhares e milhares de famílias em todo Estado, em todo País, Porto Alegre teve três nos últimos meses, cerca de cinco mil famílias jogadas a uma crise social sob responsabilidade do não-cumprimento das responsabilidades políticas daqueles que têm o direito de decidir, estão com as responsabilidades políticas nas mãos. É essa a resposta que recebemos quando perguntamos “Onde moras?”.

Hoje o brasileiro, o trabalhador, o desempregado considerado também miserável ou vagabundo como muitos chamam, uma palavra que hoje está um tanto desgastada, mas valorizada pelo próprio trabalhador, estamos com seis milhões de desempregados e estes são considerados vagabundos. Queremos nesse processo garantir e deixar claro que cada vez que houver uma ocupação, cada vez que formos chamados de vagabundos, de marginais, nós o somos pela própria condição político-social que nos coloca os próprios governantes deste País, que atende aos interesses de uma parcela que é a minoria deste País e não atende aos interesses da maioria deste País que os coloca lá dentro para governar este País.

Para concluir eu coloco essa resposta gritante à pergunta “Onde moras?” que nós estamos recebendo a toda hora, a todo minuto. Eu pego um grito que um tanto conhecido de todos, mas tento remendá-lo: “Brasil, mostra tua cara e me responde onde moras”. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra o nosso orador, em nome da CNBB, Secretário de Comunicação da Região Sul III, Dr. Elton Bozetto.

 

O SR. ELTON BOZETTO: Excelentíssimo Presidente desta Sessão, Ver. Clóvis Ilgenfritz; Ver. Gerson Almeida e demais Vereadores; Excelentíssimo Irmão Avelino, Vice-Reitor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e demais entidades ligadas ou não à Igreja e que se empenham quanto à questão da moradia. Atenta aos sinais dos tempos modernos, ao clamor de milhões de pessoas sem casa neste País e também ouvindo sugestões de diversos agentes de pastoral por este Brasil afora, a CNBB indicou como tema da campanha da Fraternidade no ano de noventa e três “A Questão da Moradia”. Do lançamento dessa campanha na quarta-feira de cinzas, exatamente quarenta dias antecedendo a Páscoa, o Papa João Paulo II dizia em cadeia de rádio e televisão que o lema “Onde moras?” indica deficiência numa das exigências essenciais do homem de possuir os meios necessários para uma vida digna. Desse modo, referia-se o Papa, a fé nos intima ao compromisso pessoal de sair em defesa da justiça.

Particularmente, no âmbito dos direitos fundamentais da pessoa humana e a campanha da fraternidade, encerrada no último domingo, tinha como objetivo central, e que será retomado como tema de diversos encontros e eventos promovidos, pela Igreja, no curso deste ano, objetivava firmar o direito à moradia como condição básica para o desenvolvimento da vida plena, vida plena do indivíduo, da família, da fraternidade e, acima de tudo, do exercício da cidadania. A moradia não quer ser entendida pela Igreja, apenas no seu aspecto econômico, financeiro ou político, mas também e especialmente no âmbito da ética e das relações primeiras, nas quais a moradia é sinal de aconchego, educação, convivência e geração da dignidade humana e da qualidade de vida para o povo brasileiro. Aproximadamente, 14 milhões de famílias, se não me engano, não têm endereço em nosso País. Frente a esse déficit habitacional, a CNBB quer incentivar as iniciativas, as organizações populares e assumir um compromisso conjunto com toda a sociedade, especialmente aqueles setores que se empenham na discussão e na gestão de projetos viáveis para romper com essa dura realidade. Vários documentos, inclusive de caráter internacional, como a Declaração Universal dos Direitos do Homem, afirmam claramente o direito à moradia.

O lema interrogativo “Onde moras?” procura conhecer as causas do déficit habitacional e as condições de moradia. Quer questionar também a baixa renda da população, a legislação brasileira e, principalmente, a política habitacional inadequada. Tomar consciência da complexa situação dos sem-teto não pode reduzir a uma interpretação crítica apenas; deve abranger uma avaliação ética desse desafio e considerar toda a sociedade no estabelecimento de políticas e planos capazes de reverter o desolador quadro com o qual convivemos hoje. A falta de moradia não é um fator isolado, ela cresceu concomitantemente ao êxodo rural, ao empobrecimento, ao desemprego, à concentração de renda, chegando hoje à cifra já mencionada pelo Ver. Lauro de 77% da população brasileira morando nos centros urbanos. Aproximadamente 120 milhões de pessoas vivendo e, o que é pior, sobrevivendo ladeados pela falta de infra-estrutura, de saneamento básico e outras condições. Tudo isso sem mencionar o problema grave e ético da especulação imobiliária, dos interesses econômicos e da falta de vontade política para implementar medidas viabilizando possíveis saídas para o problema da falta de moradia.

Frente a esta drástica situação, o que propor e o que nos resta fazer? É importante lembrar que o sem-terra do campo torna-se o sem-casa, e as soluções começam, evidentemente, pela reforma urbana. Pergunta-se, ela é juridicamente viável, e possível? Poder-se-ia responder que ela será possível, quando se tiver consciência de que ela é socialmente necessária.

Regularização fundiária, ocupações de vazios urbanos, declaração de interesse social às grandes áreas de especulação. Incentivo à autoconstrução e mutirão de moradia. Subsidiar construção à população de baixa renda. Apoio às associações comunitárias e organizações que se empenham na implementação de iniciativas populares, são iniciativas possíveis. Ao lado destas, a Igreja reafirma dois elementos válidos, necessários e fundamentais no acesso à moradia, como condição de vida plena e também condição no processo de urbanização. O primeiro deles, que reafirmamos, o acesso à terra, isto significa locais com o mínimo de infra-estrutura e condições de transporte, acesso ao trabalho, à escola, à saúde. A moradia não se entende como um componente isolado, num abrangente processo de urbanização e condições mínimas de vida digna. Um segundo aspecto que se quer reafirmar é a concessão e aplicação de recursos financeiros. Aqui a Igreja reserva apreço e apoio especial ao mencionado pelo colega que me antecedeu, o Fundo Nacional de Moradia Popular. Juntamente com sua implementação, em âmbito nacional, estadual e municipal. A Igreja sente-se hoje participante na implementação deste Fundo em diversos municípios do Estado. Cito o primeiro deles, Santa Maria, que no mês passado foi instalado o Fundo Municipal de Moradia Popular.

Por fim, o compromisso da Igreja com aqueles que não têm casa, é, antes de tudo, humanitário e evangélico, expressão do seu amor pela vida e pela vida em abundância. Em suma, devemos dizer que a moradia é educação e conscientização para organização e reivindicação do direito ao desenvolvimento da vida plena do indivíduo, da família, da comunidade e, acima de tudo, do exercício da cidadania. Sou grato.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Ao encerrar esta Sessão destinada a debater o tema da Campanha da Fraternidade, proposto pela CNBB, “Onde Moras?”, queremos, mais uma vez, salientar a todos os presentes, o quanto esta Casa tem, através de vários Vereadores e também de projetos oriundos do Executivo Municipal, buscando soluções para esse problema urbano, social e humano, que é o da habitação. Os Vereadores que falaram já se referiam a projetos nas várias áreas e nós adendaríamos ainda alguns projetos que consideramos importantes nesse tipo de enfoque que está sendo dado pela CNBB, que é a busca da solidariedade e da participação. Hoje nós sabemos que o nosso Município estuda maneiras de como resolver o problema, só que, Secretário Burmeister, o Município não vai conseguir resolver por si só os problemas, mas pelo que pudemos notar e pela soma do que pode ser tirado deste encontro, há como resolvê-los. O Governo do Estado nos traz aqui notícias que já conhecíamos, mas enfoca com números e dados que são alentadores, oriundos dessa modificação de ICMS. Nós temos campanhas, a nível nacional, do movimento dos sem-teto, do movimento dos sem-terra e do sindicalismo, através das centrais sindicais e, especialmente, da CUT, pressionando o Ministério do Trabalho e os ministérios do Governo Itamar para que o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço volte, para benefício do trabalhador neste País, porque, agora, infelizmente, em sua maior parte, não está sendo utilizado para o fim a que foi destinado no fim da década de 60.

Então, nós temos, através do Ministro Barelli, uma promessa e também um esforço que poderá ser exitoso, se todos nós, com a Campanha da Fraternidade, com as campanhas que estão sendo colocadas pelo movimento social em geral, pressionarmos para que o FGTS seja revertido a nível social.

Queremos agradecer em nome da Casa, em nome da Mesa Diretora a oportunidade de realizar esta Sessão que foi taquigrafada, gravada e vai estar à disposição, através do nosso proponente, Ver. Gerson Almeida e da Casa.

Nós, como Vereadores, no início do mês de março, tivemos oportunidade de fazer uma Moção, que esta Casa aprovou por unanimidade, chamando a atenção para este fato de a Campanha da Fraternidade deste ano estar sendo dirigida à questão da moradia, da habitação.

Esta Moção, aprovada por unanimidade, foi envidada a D. Paulo Moretto, à CNBB Nacional e a outras entidades.

São iniciativas modestas que, somadas a esta do Ver. Gerson Almeida, seguramente nos ajudarão a encontrar o caminho, como já foi dito, porque não há mais o que esperar, principalmente agora que vislumbramos recursos. E isto é importante.

Muito obrigado a todos pela participação, pela presença aqui. Damos por encerrada a presente Sessão Especial.

 

(Encerra-se a Sessão às 17h.)

 

* * * * *